segunda-feira, 12 de setembro de 2005

Crise Ética

Embora a crise brasileira esteja sendo tratada como política, trata-se, na verdade, de uma crise ética. Crise esta que nossa sociedade vem enfrentando desde muito tempo ou até de sempre.
Esta semana fatos revelaram como se trata de acordo com as conveniências o que é ético ou não.
Em artigo do jornal O Globo, de 10/09/2005, noticiava-se:

... - Não podemos ter uma sessão dirigida por Severino. Desde que ele se comprometa a não presidi-la, vamos manter a sessão para votar a cassação de Roberto Jefferson — advertiu o líder da minoria, deputado José Carlos Aleluia (PFL-BA).

Mas um “afastamento branco” (como uma licença médica) interessaria apenas a Severino e ao PFL, já que o deputado José Thomas Nonô (PFL-AL) assumiria o comando da Casa. Os demais partidos de oposição exigem a renúncia de Severino, para realização de nova eleição...

11/09/2005 - 12h32m

Severino descarta afastamento temporário por licença médica
Globo Online BRASÍLIA
O presidente da Câmara dos Deputados, Severino Cavalcanti, negou neste domingo a possibilidade de pedir um afastamento temporário por meio de licença médica do cargo. - Eu (estando) doente já saí do hospital. Não vou agora adoecer de novo para deixar de cumprir com minha obrigação para com a população e com a Câmara dos Deputados - afirmou. Severino garantiu ainda que irá presidir todas as sessões da Câmara. O deputado concede uma entrevista coletiva à imprensa, em Brasília.

O fato de ser cogitado “um afastamento branco” através de uma “licença médica” por si só já indicaria uma grave falta de ética, ou decoro como preferem, por parte do Presidente da Câmara, bem como de seus pares, que o sugerem, tendo em vista que forjar uma licença médica se constitui fraude, se constitui crime.

Art. 299 - Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrito, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante:
Pena - reclusão, de 1 (um) a 5 (cinco) anos, e multa, se o documento é público, e reclusão de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa, se o documento é particular.

Parágrafo único - Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se do cargo, ou se a falsificação ou alteração é de assentamento de registro civil, aumenta-se a pena de sexta parte.
Art. 301 - Atestar ou certificar falsamente, em razão de função pública, fato ou circunstância que habilite alguém a obter cargo público, isenção de ônus ou de serviço de caráter público, ou qualquer outra vantagem:
§ 1º - Falsificar, no todo ou em parte, atestado ou certidão, ou alterar o teor de certidão ou de atestado verdadeiro, para prova de fato ou circunstância que habilite alguém a obter cargo público, isenção de ônus ou de serviço de caráter público, ou qualquer outra vantagem:
Pena - detenção, de 3 (três) meses a 2 (dois) anos.

O uso deste expdiente tem sido feito em grande escala. Hora são convidados a depor em CPIs, ora são convidados a depor na PF, todos se declarando clinicamente impedidos de comparecerem para depor.

Art. 304 - Fazer uso de qualquer dos papéis falsificados ou alterados, a que se referem os arts. 297 a 302:
Pena - a cominada à falsificação ou à alteração.

Por sua vez, o médico que atesta o impedimento clínico para o comparecimento, também incorre em crime de falsidade de declaração. Deveria ter seu diploma posto em julgamento pelo órgão de classe, além é claro de sofrer as penas da lei.

Art. 302 - Dar o médico, no exercício da sua profissão, atestado falso:
Pena - detenção, de 1 (um) mês a 1 (um) ano.

Este expediente, infelizmente é usado indiscriminadamente por todos os segmentos da sociedade brasileira. Desde a falta ao trabalho até uma “segunda chamada” em provas escolares, o atestado médico é usado de forma escancarada. Sabidamente sujeito a falsidade ele é aceito com reservas, dando-se um “crédito” ao mesmo somente pela impossibilidade de sua contestação.

O que chama a atenção é o fato da mídia, dos políticos, dos “formadores de opinião” tratar este fato como coisa natural, como estratégia válida para se fugir de uma situação indesejada.

Passou sem nenhum comentário, sem nenhuma contestação.
De tão comum, este expediente, não causa o mínimo constrangimento seu uso nem sua indicação como álibi.