quinta-feira, 12 de setembro de 2013

Um fato na teoria do fato



Houve um tempo em que, em minha casa, morava minha mãe, minha irmã, eu e mais um irmão de criação.
Em uma ocasião qualquer, minha mãe fez alguns pastéis para comermos, nos fartamos e, sobraram exatamente três pastéis. Como em todas as casas, o prato com esses pastéis foi para a boca da panela, tampa por cima.
Horas depois, perguntei à minha mãe se poderia comer mais um. Claro! Respondeu ela.
Lá fui eu pegar mais um pastel e, surpresa! Não havia mais nenhum, só o prato na boca da panela.
Minha mãe pergunta para minha irmã se ela havia comido os pastéis. Não, disse ela.
Chama meu irmão de criação e faz a mesma pergunta. Mesma resposta.
A cada um questionado, a tampa era levantada do prato para que constatasse a ausência dos ditos cujos.  Ninguém havia comido, mas, eles tinham desaparecido.
Não foi minha mãe, não fui eu, não foi minha irmã, nem o meu irmão de criação. Como?
Alguém estava mentindo.
Sobrou para o menor, meu irmão de criação.
- Foi você? Perguntava minha mãe.
- Não. Respondia ele. Esse diálogo se repetiu algumas vezes.
- Se não fui eu, diz minha mãe, não foi o Luiz nem a Lidia, só pode ter sido você. Afirmava minha mãe.
- Não fui eu. Dizia ele, quase chorando.
A cada pergunta, o prato vazio era mostrado.
Eis que, na última pergunta, já com a afirmativa da culpa dele, minha mãe vira a tampa e, lá estavam os três pastéis, coladinhos. O vapor acumulado na tampa havia molhado os pastéis, que colou ali.
A prova estava clara, os pastéis não estavam lá. Mas a verdade estava encoberta pela tampa da panela.
Tirei desse episódio, para a minha vida, uma lição.

Não se deve culpar ninguém sem antes esgotarem-se todos os argumentos.

Não quero e não vou abrir polêmicas e discussões sobre o que falo a seguir, mas não posso deixar de me manifestar sobre um assunto tão polêmico. O julgamento da AP 470.
Ontem o STF encerrou seus trabalhos, de votação da admissibilidade dos embargos infringentes, com quatro votos a favor e dois contra, indicando que serão acatados, no dia de hoje.
Já vi manifestação do tipo “pizza assando”, “não vai dar em nada” e, a mais emblemática, vindo de um “grande articulista da grande mídia”: “está virando um julgamento político”.
Virando como? Não está sendo?
Acompanho com interesse de leigo, desde o início. Não sou advogado, nem jurista. Sou um leigo interessado. Assisto TV Justiça, leio jornais e revistas, busco na internet, ouço e leio opiniões diversas – nesse caso, em particular. Mas não abro mão de construir minha opinião.
A admissão dos embargos infringentes não tem nada a ver com a obrigatoriedade em mudar o resultado anterior do julgamento. Muito pelo contrário, caso se venha a reafirmar esse resultado, este será mais forte e condizente com o que chamamos justiça. Rever posições é um dever do julgador, caso esse se convença, através das provas, que exagerou ou errou em sua avaliação.
Dizem: é melhor dez culpados soltos do que um inocente preso.
Recursos foram criados para que a sentença final esteja tão depurada que não haja mais dúvida sobre ela.
Se existem exageros na quantidade de recursos que se pode impetrar, esse é outro assunto, para outra ocasião. Não no meio de julgamento. A regra está posta e não pode ser mudada no meio do caminho.
Esse é um julgamento político, existe um clamor por justiça – que não pode virar justiçamento, para que não entre para a História como um erro clamoroso.
É importante que nossos parâmetros mudem e, que ricos e engravatados, senhores do dinheiro e de poder, também freqüentem nossas cadeias. Mas não a qualquer custo.

Nenhum comentário: