terça-feira, 3 de setembro de 2013

O projetor 16mm



Quanto eu tinha uns cinco ou seis anos, meu pai comprou um projetor de 16mm, da marca Victor.
Quem é da minha época de infância irá se lembrar das tardes/noites de sessão de cinema na Vila.
Filmes alugados a Embaixada Americana. Naquela época não tinha locadoras e eram as embaixadas que faziam a divulgação de seus filmes.
Em dia de sessão, um lençol era preso na parede da casa vizinha a vila, em frente à casa três, onde era colocado o projetor, para dar a distância suficiente.
A garotada sentava no chão para curtir a exibição dos desenhos animados. Gato Félix, Alice no País das Maravilhas, comédias do Gordo e o Magro, Abbott & Costello e muitos outros.
Tinha gente que passava pela rua, via o movimento na vila e entrava para desfrutar dessa sessão de cinema familiar.
Esses mesmos filmes que eram exibidos para nós, meu pai e minha mãe exibiam, também, para comunidades carentes. Subiam os morros do Rio e, faziam o mesmo que faziam na vila. Algumas vezes, estava eu junto a eles nessas empreitadas. Eram tempos em que não havia violência e, sempre eram acolhidos com respeito e carinho.
Esse, certamente, foi o meu primeiro contato com a realidade da vida. Com a pobreza e com a generosidade, tanto de meus pais como das pessoas que eram brindadas com aquele agrado.
Muito pouca coisa diante do que era necessário, mas dava para ver o quanto era importante para aquelas pessoas aquele momento de carinho.
Não me tornei nenhum santo, nem cheguei perto disso, mas, consegui ao longo de minha vida, entender o que as pessoas que não tem nada, ou quase nada, sentem quando lhes oferecem um pouco que seja.
Enquanto batemos boca, pessoas como nós estão precisando de atenção.
Enquanto discutimos se devemos construir hospitais e contratar médicos ou, contratar médicos e depois construir hospitais, a diarreia está matando.
Enquanto acharmos que a estrutura é maior do que o ser humano, não chegaremos a lugar algum.
Enquanto ficarmos procurando quem é o responsável em tomar atitude ou quem deixou de tomá-las, muita gente irá morrer.
Precisamos agir mais e falar menos.
Precisamos olhar para dentro de nós e, encarar o que precisamos e devemos fazer.
A fome não espera, a vida não espera.
A retórica só acalenta aqueles que se acham poderosos. Não resolve problema de quem os tem.

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